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A (IN)VALIDADE DE CLÁUSULAS QUE ESTIPULEM CONDIÇÕES ESPECÍFICAS DE PAGAMENTO PARA OS CREDORES RETARDATÁRIOS NO PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL 5q4f6e

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Rodrigo da Guia Silva[1] 47r5j

Thiago Merhy Parga Rodrigues Couto[2]

1. Introdução

                   O presente artigo pretende expor de que que forma os Tribunais têm recepcionado o debate sobre a (in)validade de cláusulas que estipulem condições específicas de pagamento para os credores retardatários no plano de recuperação judicial (PRJ).

                   A partir da análise de decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ), do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) e do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), buscamos identificar os limites de legalidade (validade) do tratamento específico que os credores habilitados tardiamente poderão receber. Com efeito, estruturamos o artigo em duas partes: a primeira trata do atual debate sobre a (in)validade, na jurisprudência, das condições específicas de pagamento para os credores retardatários, com especial foco no STJ e no TJSP; e a segunda aborda a definição de eventual forma pela qual o pagamento dos credores retardatários poderia se diferenciar dos regularmente habilitados.

                   Após esse desenvolvimento, constatamos que a jurisprudência tende a impedir esse tratamento diferenciado, devido à incidência do princípio da igualdade entre credores na recuperação judicial. Especificamente quanto ao contexto de credores retardatários trabalhistas, também se veda a estipulação de cláusulas que prevejam prazo de pagamento em contrariedade ao art. 54 da Lei nº 11.101/2005 (LREF).

                   Nada obstante, seria possível vislumbrar, em cenário diverso, que a simples previsão de incidência automática de uma das opções de pagamento para os retardatários – em razão da ausência de escolha tempestiva – não implicaria desrespeito ao disposto pelo art. 54 da LREF e, principalmente, ao princípio da igualdade entre credores.

2. O debate sobre a validade das condições específicas de pagamento para os credores retardatários nos Tribunais

                   Inicialmente, vale rememorar que o art. 7º, § 1º, da Lei nº 11.101/2005 estipula o prazo de 15 dias, a contar da publicação do edital de que trata o art. 52, § 1º, do mesmo diploma, para a habilitação de créditos na recuperação judicial – também conhecida como fase istrativa.

                   Após esse prazo, retardatária considera-se a habilitação.[3] A princípio, o atraso (justificado ou não) na habilitação não implicaria penalizações em termos de forma de pagamento desse crédito, conforme podemos ver no art. 10 da LREF, embora os credores retardatários sofram restrições em termos de direito de voto (cf. § 1º do mencionado artigo).[4]

                   Feitas essas considerações iniciais, questiona-se de que forma a jurisprudência aborda a (im)possibilidade de se estabelecerem condições especiais de pagamento aos credores retardatários. Frisa-se que o cenário não envolveria propriamente a criação de uma subclasse de credores,[5] mas sim a diferenciação (no mais das vezes, penalização) do credor que habilita seu crédito tardiamente, ou seja, uma diferenciação entre credores da mesma classe.

                   Como se destaca a seguir, a maioria dos casos se vincula à (im)possibilidade de estipular condições específicas de pagamento aos credores trabalhistas retardatários, em razão, majoritariamente, do caput do art. 54 da LREF.[6]

                   Ainda que haja pouca repercussão do tema no STJ,[7] a 3ª Turma da Corte Superior (REsp nº 2.166.584/RJ) parece ter estabelecido um limite material às cláusulas vinculadas ao pagamento de credores retardatários. A partir da interpretação do caput do art. 54 da LREF, a Corte posicionou-se no sentido da impossibilidade de diferenciar os credores (trabalhistas) habilitados dos retardatários. Além disso, ainda se consignou que essa diferenciação dentro da classe I implicaria desrespeito ao par conditio creditorum.[8]-[9]-[10]-[11]

                   Ou seja, segundo o entendimento prevalente, o plano de recuperação judicial não poderia impor condições específicas aos credores retardatários. Nesse sentido, veja-se acórdão do STJ:

RECURSO ESPECIAL. EMPRESARIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. FALHA NA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. CRÉDITO TRABALHISTA. HABILITAÇÃO RETARDATÁRIA. CONDIÇÕES DE PAGAMENTO. ARTIGO 54 DA LREF. ALTERAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.

1. Não viola os artigos 489 e 1.022 do Código de Processo Civil nem importa deficiência na prestação jurisdicional o acórdão que adota, para a resolução da causa, fundamentação suficiente, porém diversa da pretendida pelo recorrente, para decidir de modo integral a controvérsia posta.

2. O crédito trabalhista, cujo pagamento deve obedecer ao regramento legal, não pode ser pago em condição diversa, sob o pretexto de que se trata de crédito retardatário.

3. Recurso especial conhecido e não provido.[12]

            No TJSP, reforça-se esse entendimento. Por exemplo, na recuperação judicial dos Laboratórios Baldacci Ltda., entendeu-se que as cláusulas que impunham carência e prazo de pagamento distinto aos credores retardatários trabalhistas deveriam ser anuladas. De acordo com o julgado, mostra-se “desapropriado utilizar a ferramenta para penalizar os retardatários, com a imposição de carência e prazo de pagamento só contados da habilitação definitiva”, tendo em vista a “necessária preservação da paridade entre os credores, independente do momento da habilitação do crédito”.[13]

O TJBA também já proferiu acórdão impedindo que a condição de habilitação retardatária implicasse um desconto de 20% no pagamento do crédito. O acórdão fundamentou a ilegalidade da respectiva cláusula no princípio da igualdade de credores, destacando, ainda, que a habilitação tardia é uma faculdade dos credores.[14]

Com base em aplicação direta do art. 54 da LREF, na recuperação judicial de Dermiwil Indústria Plástica Ltda e outras, o TJSP afirmou que o prazo para pagamento do crédito trabalhista retardatário não poderia violar o prazo de 1 ano estabelecido no caput do art. 54 da LREF, sendo que o trânsito em julgado da decisão que reconheceu o crédito trabalhista não poderia ser utilizado para a contagem de tal prazo. Desse modo, o Tribunal concluiu que, “caso superados os prazos do art. 54 da LREFF ao tempo do trânsito em julgado que reconheceu o crédito trabalhista, o pagamento deste crédito deve ser realizado imediatamente após a data de publicação da decisão de habilitação”.[15]

            Na recuperação judicial da Netten Tec Produtos Técnicos Eireli, a cláusula 8.1 do PRJ tratava do pagamento dos credores trabalhistas e previa pagamento em prazo diferenciado para os credores não relacionados no Quadro Geral de Credores (QGC). Ao apreciá-la, o TJSP afastou a previsão diferenciada de pagamento dos credores trabalhistas retardatários, determinando “que se paguem incontinenti os trabalhistas retardatários”,[16] aparentemente com o mesmo fundamento destacado acima – i.e., a impossibilidade de pagamento dos credores trabalhistas em discordância com o art. 54 da LREF.

            Na recuperação judicial de Moinho de Trigo Corina Ltda., o TJSP também aplicou o art. 54 da LREF para afastar a previsão de que o prazo de 1 ano fosse contado a partir da data em que o credor trabalhista retardatário postulasse pagamento nos autos da recuperação judicial.[17] Esse também foi o entendimento do TJSP na reestruturação do Grupo Enfil,[18] bem como em diversos outros procedimentos recuperacionais.[19]

                   Mais recentemente, o Ministro Humberto Martins proferiu decisão monocrática[20] que parece ratificar o entendimento do STJ. No âmbito do AREsp nº 2.468.534/PR, o Ministro julgou acertada a anulação de certa cláusula de um plano que restringia o pagamento dos credores quirografários retardatários a um limite global.[21] Ou seja, impor-se-ia um perdão forçado da dívida, além de um desrespeito à igualdade entre os credores.

            Como se buscou ressaltar, a jurisprudência – destacadamente, do STJ e do TJSP – tende a vedar a estipulação de condições específicas de pagamento aos credores retardatários, em razão do desrespeito à paridade entre credores, princípio usualmente reconhecido também no contexto da recuperação judicial. Em relação ao crédito trabalhista retardatário, também se veda a elaboração de cláusulas que imponham prazos de pagamento diversos em contrariedade ao art. 54 da LREF.

Um possível distinguishing: a incidência automática de uma das opções de pagamento aos credores retardatários

Sem embargo das considerações antecedentes, parece possível vislumbrar que o entendimento poderia ser alterado caso, ao invés de se impor tout court condições diferenciadas aos credores retardatários em relação aos demais da mesma classe ou subclasse, o plano de recuperação judicial apenas estabelecesse a incidência automática de umas das opções de pagamento aos credores retardatários – justamente diante da ausência do exercício tempestivo da opção por tais credores.

A esse respeito, no âmbito da primeira recuperação judicial da Oi S.A., o TJRJ já entendeu que os credores retardatários, como não podem votar o PRJ, “também não possuiriam a faculdade de optar pela forma de recebimento de seu crédito”. Assim, a “imposição de uma das opções de pagamento” à parte não feriria a igualdade entre credores de mesma classe.[22]

Assim, sem prejuízo ao contexto explicitado no item antecedente, nota-se que a referida decisão do TJRJ oferece um cenário em que, de certa forma, se diferenciam os credores retardatários daqueles regularmente habilitados. Com efeito, permitiu-se a imposição de uma das opções de pagamento aos retardatários, tendo em vista que, como não podem votar o plano de recuperação judicial,[23] também não teriam a faculdade de optar pela forma de recebimento de seu crédito.

3. Notas conclusivas

                   Embora a questão da (in)validade de condições específicas de pagamento aos credores retardatários aparentemente ainda não seja um tema de grande repercussão na jurisprudência, nota-se que o STJ tem se posicionado no sentido de que essa diferenciação representaria um desrespeito ao princípio da igualdade entre credores na recuperação judicial.

Além disso, em diversos casos a invalidade da cláusula de tratamento diferenciado também se fundamenta na aplicação direta do caput do art. 54 da LREF, que não diferencia os credores retardatários dos habilitados no prazo do art. 7º, § 1º, da LREF.

                   Nada obstante, seria possível vislumbrar, em cenário diverso, que a simples previsão de incidência automática de uma das opções de pagamento para os retardatários em razão da ausência de escolha tempestiva não implicaria desrespeito ao disposto pelo art. 54 da LREF e principalmente, ao princípio da igualdade entre credores. Afinal, segundo tal entendimento, como os credores retardatários não podem votar o plano de recuperação judicial, também não teriam a faculdade de exercício da escolha por uma das possíveis formas de recebimento de seu crédito.

 

[1] Doutor e mestre em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Professor Adjunto de Direito Civil da Faculdade de Direito da UERJ, com atuação permanente na Graduação e no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu (Mestrado e Doutorado) em Direito. Pesquisador visitante do Max Planck Institute for Comparative and International Private Law (Hamburgo, Alemanha). Advogado e parecerista. Sócio de Galdino, Pimenta, Takemi, Ayoub, Salgueiro, Rezende de Almeida Advogados.

[2] Mestre em Direito Penal pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Cursando Especialização em Falências e Recuperação Judicial na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR). Sócio de Galdino, Pimenta, Takemi, Ayoub, Salgueiro, Rezende de Almeida Advogados.

[3] A propósito, leciona Sacramone: “Considera a Lei habilitação retardatária as habilitações apresentadas após o prazo de 15 dias a partir da publicação de edital com a lista de credores realizada pelo devedor. O termo ‘habilitação’, entretanto, não deve ser compreendido conforme redação literal. O termo utilizado no caput do art. 10 deverá ser interpretado de modo a compreender tanto as habilitações, na hipótese em que o crédito não esteja incluído na lista de credores apresentada, como as divergências ou impugnações, na hipótese de ter sido incluído crédito inexistente, de diverso valor ou natureza jurídica. Isso porque, se o habilitante pode pretender a inclusão de crédito integralmente não incluído no procedimento, não se justifica o impedimento de que não possa pretender a correção do incluído erroneamente” (SACRAMONE, Marcelo BarbosaComentários à lei de recuperação de empresa e falência. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2025. p. 98).

[4] A esse respeito, confira na doutrina: “Os retardatários na falência não votam na Assembleia dos Credores enquanto não tiver sido homologado o QGC contendo o seu crédito. Atendida essa condição, eles adquirem o direito de voto. Já os retardatários na recuperação judicial nunca adquirem o direito de voto na Assembleia dos Credores, mesmo depois de julgado itido o seu crédito. Isso porque os dois dispositivos em foco devem ser interpretados sistematicamente. Não haveria sentido em prever a ressalva apenas no término do § 2º (em virtude da qual o retardatário na falência adquire o direito de voto após a homologação do QGC) se ela também fosse pertinente à hipótese do § 1º” (COELHO, Fábio Ulhoa. Comentários à lei de falências e de recuperação de Empresas. 14. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2021. p. 147).

[5] Sobre a possibilidade de criação de subclasses, já decidiu o TJSP: “Não há ilegalidade ou inconstitucionalidade, em princípio, da previsão no plano de recuperação judicial de tratamento diferenciado entre credores integrantes da mesma classe. (...) [Trecho do voto:] Esta Câmara especializada já cristalizou a exegese sobre a questão suscitada e estabelece a possibilidade de o plano de recuperação previr tratamento diferenciado a credores integrantes da mesma classe, no caso vertente, credores quirografários, desde que o faça de forma objetiva” (TJSP. AI nº 0372448-49.2010.8.26.0000, Rel. Des. Pereira Calças, Câmara Reservada à Falência e Recuperação, j. 01/02/2011). Na doutrina, v. AYOUB, Luiz Roberto; CAVALLI, Cássio. A construção jurisprudencial da recuperação judicial de empresas. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021. p. 236.

[6] O artigo não diferencia os tipos de créditos trabalhistas para determinar o prazo em que devem ser pagos os créditos trabalhistas: “Art. 54. O plano de recuperação judicial não poderá prever prazo superior a 1 (um) ano para pagamento dos créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho vencidos até a data do pedido de recuperação judicial. (...)”.

[7] Nesse sentido, a maioria dos julgados sobre créditos retardatários no STJ explicitam a faculdade do credor “de decidir entre: i) habilitar de forma retardatária o seu crédito; ii) não cobrá-lo; e iii) ajuizar a execução individual após o encerramento da recuperação judicial. Em qualquer circunstância, terá o ônus de se sujeitar aos efeitos da recuperação judicial” (STJ. EDcl no REsp nº 1.851.692/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., j. 24/05/2022. DJ 09/09/2022). Assim também: (i) STJ. AgInt no REsp nº 1.805.349/MT, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª T., j. 13/12/2021. DJ 17/12/2021; (ii) STJ. AgInt no REsp nº 1.869.192/RS. Rel. Min. Nancy Andrighi, 3ª T., j. 15/06/2020, DJ 18/06/2020. Veja também algumas decisões monocráticas: (i) STJ. REsp nº 2.062.202/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Decisão monocrática em 22/08/2023. DJ 23/08/2023; e (ii) STJ. REsp nº 1.863.102/RS, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Decisão monocrática em 01/02/2023, DJ 06/02/2023.

[8] Sobre o princípio da igualdade entre credores, Fábio Ulhoa Coelho ressalta que se trata de um princípio típico do processo falimentar (COELHO, Fábio Ulhoa. O credor colaborativo na recuperação judicial. In: SATIRO, Francisco; TOLEDO, Paulo Fernando Campos Salles de (Coord.). Direito das empresas em crise: problemas e soluções. São Paulo: Quartier Latin, 2012. p. 107-108).

[9] Marcelo Barbosa Sacramone explica que o princípio da igualdade entre credores, embora não constitua uma obrigação legal na recuperação judicial, consiste em uma construção doutrinária (SACRAMONE, Marcelo Barbosa. SACRAMONE, Marcelo B. Comentários à lei de recuperação de empresa e falência. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2025. p. 361).

[10] Conforme o entendimento consolidado no Enunciado nº 57 da na Primeira Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal, “[o] plano de recuperação judicial deve prever tratamento igualitário para os membros da mesma classe de credores que possuam interesses homogêneos, sejam estes delineados em função da natureza do crédito, da importância do crédito ou de outro critério de similitude justificado pelo proponente do plano e homologado pelo magistrado”.

[11] Na jurisprudência, a recepção do par conditio creditorum parece ser pacífica, conforme os seguintes exemplos recentes no STJ: (i) STJ. REsp nº 1.773.522/SP, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 4ª T., j. 04/02/2025, DJ 22/04/2025; (ii) STJ. AgInt no CC nº 186.275/RJ, Rel. Min. Raul Araújo, 2ª Seção, j. 02/05/2023, DJ 10/05/2023; (iii) STJ. REsp nº 1.804.804/MS, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, 4ª T., j. 07/03/2023, DJ 13/03/2023; (iv) STJ. AgInt no CC nº 186.296/RS, Rel. Min. Marco Buzzi, 2ª Seção, j. 28/06/2022, DJ 01/07/2022; (v) STJ. REsp nº 1.804.563/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª T., j. 25/08/2020, DJ 31/08/2020; dentre outros.

[12] STJ. REsp nº 2.166.584/RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª T., j. 05/11/2024, DJ 11/11/2024, grifou-se. Veja-se, ainda, trecho do inteiro teor do acórdão: “Na hipótese dos autos, a discussão não está na validade da cláusula do plano de recuperação judicial que prevê o pagamento dos créditos trabalhistas, mas, sim, se o credor trabalhista retardatário pode ter que se submeter a regra diversa da prevista para os credores já habilitados, inserta no plano para o pagamento dos credores retardatários. (...) A impossibilidade de submeter o credor trabalhista ao pagamento estabelecido na referida cláusula é flagrante. Em primeiro lugar, o artigo 54 da LREF não faz distinção entre credores habilitados antes ou depois do prazo previsto no artigo 7º, § 1º, da LREF para o recebimento dos valores devidos na forma ali estabelecida. (...) Consigna-se, por fim, que a previsão de pagamento diferenciado para os credores da classe trabalhista é que viola a par conditio creditorum”.

[13] TJSP. AI nº 2129817-54.2021.8.26.0000, Rel. Araldo Telles, 2ª CRDE, J. 27/01/2022.

[14] “(...) 4. Observa-se que o Acórdão embargado (ID. 61846504, daqueles autos), ao analisar a cláusula 6.1.5 do Plano de Recuperação Judicial-PRJ, expressamente destacou que a imposição do PRJ ao estabelecer que os credores retardatários sofreriam uma redução de 20% no valor da dívida, violaria a igualdade entre os credores, bem como permitiria a possibilidade de a devedora impor sanções aos credores. 5. Cumpre salientar que o STJ entende que os credores podem optar por não participar da recuperação judicial. Contudo, aqueles que decidirem cobrar suas dívidas fora do prazo estabelecido terão seus créditos pagos nas mesmas condições dos demais credores que se habilitaram tempestivamente. (...)” (TJBA. EDcl nº 8022004-74.2023.8.05.0000, Rel. Maria do Rosario os da Silva Calixto, 2ª CC, j. 05/11/2024).

[15] TJSP. AI nº 2241507-54.2022.8.26.0000, Rel. Jorge Tosta, 2ª CRDE, j. 08/05/2023.

[16] TJSP. AI nº 2155905-95.2022.8.26.0000, Rel. Cesar Ciampolini, 1ª CRDE, j. 27/10/2022.

[17] “AGRAVO DE INSTRUMENTO. PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. Credores trabalhistas retardatários. Previsão de pagamento no prazo de um ano, a contar da habilitação. Impossibilidade. Art. 54 da LRF. Prazo de um ano para pagamento dos credores trabalhista é contado da homologação do plano ou do fim do primeiro prazo de stay. (...) [Trecho do voto:] O art. 54 da LRF dispõe que o plano de recuperação judicial não poderá prever prazo superior a 1 (um) ano para pagamento dos créditos derivados da legislação do trabalho ou decorrentes de acidentes de trabalho vencidos até a data do pedido de recuperação judicial. (...) Dessa forma, ainda que a habilitação do crédito seja posterior à homologação do plano, deve-se observar o marco temporal previsto na lei de regência, à luz do entendimento consolidado, ou seja, o prazo anual não pode ser contado a partir da data em que o credor trabalhista postular o pagamento nos autos da recuperação judicial” (TJSP. AgInt nº 2138835-02.2021.8.26.0000, Rel. Azuma Nishi, 1ª CRDE, j. 27/07/2022). No mesmo sentido, v. TJSP. AI nº 2138835-02.2021.8.26.0000, Rel. Azuma Nishi, 1ª CRDE, j. 06/07/2022.

[18] “(...) Crédito trabalhista retardatário (cláusula 5.1). A estipulação do pagamento em 12 (doze) meses da habilitação definitiva implica em violação ao art. 54 da LRF. Cláusula ajustada para definir, a respeito das habilitações retardatárias ultimadas após o primeiro ano de execução do plano, que o respectivo crédito deverá ser pago imediatamente. Providência que também é tomada de ofício. (...)” (TJSP. AI nº 2160411-51.2021.8.26.0000, Rel. Jorge Tosta, 2ª CRDE, j. 20/04/2022). Confira também: TJSP. AI nº 2158724-39.2021.8.26.0000, Rel. Jorge Tosta, 2ª CRDE, j. 20/04/2022.

[19] V., ilustrativamente: (i) TJSP. AI nº 2197813-69.2021.8.26.0000, Rel. Natan Zelinschi de Arruda, 2ª CRDE, j. 12/04/2022; (ii) TJSP. AI nº 2209616-49.2021.8.26.0000, Rel. Natan Zelinschi de Arruda, 2ª CRDE, j. 12/04/2022; (iii) TJSP. AI nº 2195753-26.2021.8.26.0000. Rel. Natan Zelinschi de Arruda. 2ª CRDE. j. 12/04/2022; (iv) TJSP. AI nº 2084994-92.2021.8.26.0000. Rel. Grava Brazil. 2ª CRDE. j. 19/10/2021; (v) TJSP. AI nº 2092140-87.2021.8.26.0000. Rel. Grava Brazil. 2ª CRDE. j. 19/10/2021; (vi) TJSP. AI nº 2087148-83.2021.8.26.0000. Rel. Grava Brazil. 2ª CRDE. j. 19/10/2021; (vii) TJSP. AI nº 2085000-02.2021.8.26.0000. Rel. Grava Brazil. 2ª CRDE. j. 19/10/2021; (viii) TJSP. AI nº 2046854-86.2021.8.26.0000, Rel. Grava Brazil. 2ª CRDE, j. 26/10/2021; (ix) TJSP. AI nº 2084994-92.2021.8.26.0000, Rel. Grava Brazil, 2ª CRDE, j. 28/09/2021; (x) TJSP. AI nº 2079120-29.2021.8.26.0000, Rel. Grava Brazil, 2ª CRDE, j. 28/09/2021; e (xi) TJSP. AI nº 2276015-31.2019.8.26.0000, Rel. Sérgio Shimura, 2ª CRDE, j. 05/05/2020.

[20] STJ. AREsp nº 2.468.534/PR, Rel. Min. Humberto Martins, Decisão Monocrática 31/03/2025, DJ 02/04/2025.

[21] A propósito, cumpre consignar que não se está a afirmar que haveria ilegalidade per se na utilização de um limite global para o pagamento de uma classe de credores. No que tange a essa temática do limite global, o TJSP já retratou a possibilidade de cláusulas de plano contarem com uma modalidade de pagamento condicionada a um limite global. Nesse sentido, destacamos que tanto no plano de recuperação individual da U quanto no plano de recuperação individual da USL foram inseridas cláusulas de pagamento aos credores retardatários (idênticas em ambos os PRJ’s), porém mantendo-se os termos de pagamentos dos créditos habilitados regularmente. Os planos de recuperação judicial foram homologados pelo Juiz João de Oliveira Rodrigues Filho, em 17/08/2020. Contra a decisão foram interpostos AI’s discutindo, entre outros aspectos, a imposição de um limite global da classe, mas não pareceu haver questionamento específico às cláusulas dos credores retardatários – mesmo porque, em grande parte, não houve discriminação entre retardatários e credores regulares. De todo modo, as petições denunciavam “um tratamento desigual entre os credores”. Os recursos não foram providos por se entender, entre outras razões, que “estabelecer um limite global para determinada forma de pagamento, não caracteriza tratamento diferenciado, não havendo que se falar em violação a ‘par conditio creditorum’”. Vale ressaltar que, no caso em tela, não havia diferenciação entre os créditos habilitados e os retardatários, tampouco redução proporcional dos valores destes últimos: “(...) V) Em que pese a irresignação da agravante, o recurso não deve ser provido. Isso porque, é plenamente razoável o estabelecimento de formas diferenciadas de pagamento entre subclasses de credores, a fim de preservar as relações empresariais, relevantes para a preservação da empresa e cumprimento do próprio plano de recuperação. (...) Ora, tratamento igualitário refere-se à aplicação da mesma regra àqueles que se encontram nas mesmas condições, o que ocorreu no presente caso. Ademais, estabelecer um limite global para determinada forma de pagamento, não caracteriza tratamento diferenciado, não havendo que se falar em violação a ‘par conditio creditorum’” (TJSP. AI nº 2252080-25.2020.8.26.0000, Rel. Alexandre Lazzarini, 1ª CRDE, j. 23/03/2022). No mesmo sentido: TJSP. AI nº 2253575-07.2020.8.26.0000, Rel. Alexandre Lazzarini, 1ª CRDE, j. 23/03/2022.

[22] TJRJ. AI nº 0011824-24.2018.8.19.0000, Rel. Mônica Maria Costa di Piero, 8ª Câmara Cível, j. 18/09/2018. No mesmo sentido, v. TJRJ. AI nº 0010575-38.2018.8.19.0000, Rel. Mônica Maria Costa Di Piero, 8ª CC, j. 18/09/2018.

[23] Vale ressaltar, contudo, a existência de julgados do TJSP acolhendo o entendimento que permite o voto de credores retardatários a partir do pedido de reserva de crédito. V., ilustrativamente: (i) TJSP. AI nº 2126497-93.2021.8.26.0000, Rel. Araldo Telles, 2ª CRDE, j. 22/11/2021; (ii) TJSP. AI nº 2270245-52.2022.8.26.0000, Rel. Tavares de Almeida, 23ª CDP, j. 16/12/2022; e (iii) TJSP. AI nº 2194695-85.2021.8.26.0000, Rel. Jorge Tosta, 2ª CRDE, j. 10/05/2022.

Autor(a)
Rodrigo da Guia Silva / Thiago Merhy Parga Rodrigues Couto
Informações do autor
Rodrigo da Guia Silva
Doutor e mestre em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Professor Adjunto de Direito Civil da Faculdade de Direito da UERJ, com atuação permanente na Graduação e no Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu (Mestrado e Doutorado) em Direito. Pesquisador visitante do Max Planck Institute for Comparative and International Private Law (Hamburgo, Alemanha). Advogado e parecerista. Sócio de Galdino, Pimenta, Takemi, Ayoub, Salgueiro, Rezende de Almeida Advogados.

Thiago Merhy Parga Rodrigues Couto
Mestre em Direito Penal pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Cursando Especialização em Falências e Recuperação Judicial na Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR). Sócio de Galdino, Pimenta, Takemi, Ayoub, Salgueiro, Rezende de Almeida Advogados.

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